4 de junho de 2011

A Abelha Rainha

        Era uma vez uma abelhinha muito bonitinha e atarefadinha. Chamava-se Abie. Era muito trabalhadora e cumpridora, inteligente e competente. Saía da colmeia sempre a horas para ir buscar o pólen. Procurava-o nas flores mais doces e vinha sempre muito carregada, pois queria contribuir o mais possível para a abundância de mel da sua colmeia. Preocupava-a o sustento de todas as suas companheiras obreiras. Mas a certa altura, o mel tão afamado pela sua doçura, começou a perder o seu açúcar e passou a ter um sabor que, na fatigada colmeia, gerou um tremor.
        A Abelha Rainha gritou, chamou e todas convocou. Bzzz bzzz, queria melhor pólen, pólen verdadeiramente melhor. Bzzz, bzzz, fossem procurar mais longe, fossem procurar melhor. Bzzz, bzzz, fossem mais trabalhadeiras, assim são as abelhas, por isso são obreiras. Bzzz, bzzz!
        Abie saiu mais cedo. Mais cedo uma hora saiu. Voou, voou, voou, até que mais longe chegou. Mais longe chegou, e flores encontrou. E em estas flores encontrando, o pólen foi carregando e, no entretanto, suas asinhas foram pesando. Pesando foram suas asinhas, no voo de regresso. Cada vez mais cansadinhas, para o chão lhe pesavam. Redobrou as forças que a abandonavam, mas as asas para o chão pesavam. Agarrou-se às forças que ainda lhe restavam, quando largos fios de suor de cansaço a ensopavam, escorriam e pingavam e a vista suada lhe turvavam, até que chegou ao seu destino.
        Bzzz, bzzz, que vem a ser isto? Bzzz, bzzz, trazes o pólen todo ensopado no teu suor? Bzzz, bzzz, assim não nos serve de nada!!! Bzzz, bzzz, quem é que quer o sabor do teu suor no mel? Bzzz, bzzz, para já não falar na falta de higiene! Bzzz, bzzz, mas onde é que foste? Bzzzzzzzzz, o quê? Bzzz, bzzzz, não sabes que essas flores são as que têm pólen menos açucarado? Bzzzzzzzzzz, bzzzzzzz, incompetente! Bzzz, bzzzz, perde mais um dia de trabalho e ficas sem jantar. Bzzz, sabes onde é que se vai buscar bom pólen? É bzzzzz, bzz, bzzzzz, bzzz, bzzzzzzzz, bzz, bz, bzzzzzz!
        Abie saiu ainda mais cedo. Mais cedo duas horas saiu. Voou, voou, voou, até que à tal quinta chegou. Era fresca e perfumada. Plena doçura no ar. As flores eram bonitas e sorridentes; brancas, amarelas e quentes. Riam-se suavemente, com as cócegas que Abie fazia com as suas patas colectoras. Perfumavam o ar com o perfume mais floral, enquanto, recolhendo o pólen, Abie pisava os espermatozóides dos machos e, pousando de flor em flor, pisava as fêmeas, fecundando-as. Mas a chuva veio chover. Choveu primeiro um chuvisco, depois choveu chuvosamente, tornando o dia chuvoso, por tanta chuva que veio chover. Abie não podia voar na chuva. Asas molhadas não voam. E amparada no abraço doce da rosa amarela, não trabalhou o resto do dia, nem viu o céu até este parar de chorar completamente. E quando o tempo melhorou, e limpo e seco ficou, Abie em segurança voou, até que ao seu destino chegou.
        Bzzz, bzzz, que vem a ser isto? Bzzz, bzzz, não trazes quase pólen algum! Bzzz, bzzz, assim não dá para fazer nem um pote de mel!!! Bzzz, bzzz, o que andaste a fazer o dia todo? Bzzz, bzzz, nem mas nem meio mas! Bzzzzzzzzzz, bzzzzzzz, incompetente! Bzzz, bzzz, eu avisei-te. Bzzzzzzzzz, ficas sem jantar. Bzzz, bzzzz, sabes o que vais fazer amanhã? É bzzzzz, bzz, bzzzzz, bzzz, bzzzzzzzz, bzz, bz, bzzzzzz!
        Abie saiu mais cedo ainda. Ainda estava escuro quando saiu. Nada tinha comido, nem dormido. Os olhos pesavam-lhe e as asas também. O estômago leve, o ânimo, nem por isso. Voou para o reino do pólen. O reino onde o pólen é o mais rico, mais abundante, mais açucarado. Mais arriscado. Ficava no jardim botânico dos humanos. Poderia não escapar com vida. De flor em flor voou, de um humano e de outro escapou. Pólen procurava, humano avistava. Pólen colhia e do humano fugia. Pólen recolhia, quando uma mão se erguia, e o pólen guardava, quando a mão velozmente baixava, mas a rosa amarela fechou-se, virou-se e a mão foi-se. No abraço quente da rosa, Abie chorou, chorou, chorou até que uma voz escutou.
        Os teus problemas, só tu os podes resolver. Encontra a sua origem e encontrarás a solução.
        De volta Abie voou. Com força e vigor voou. Voou decididamente, voou corajosamente, carregando apenas a sua vontade. E cheia de segurança voou, até que o seu destino chegou.
        Foi como um voo veloz e certeiro, o seu discurso articulado, desembaraçado, firme e verdadeiro. Foi como um ferrão no peito em cheio. Defendeu a sua opinião, a sua razão, com todo o coração. A Abelha Rainha … Nem um bzz…
        As abelhas receiam usar o seu ferrão, pois normalmente acabam por morrer um ou dois dias depois. Mas Abie não morreu, nem mais se ouviu Bzzz.
        As abelhas obreiras continuaram a buscar pólen nos lugares habituais. E o mel, esse está mais doce que nunca.
Sally M

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